quinta-feira, 30 de outubro de 2008
















Talvez quisesse que não fosse verdade
a felicidade que ora insiste em não me deixar só...
Incomoda... e me diz que não devo parar...
acostumei em não encontrá-la por aí
E agora que está aqui, fico sem saber...

...parar o quê?

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

A fruta só

Sabe quando tem algo assim...
gritanto, implorando, querendo sair de mim?
É que me inquieto e tudo parece silêncio...
E tudo parece não ter mais por onde ficar.
Igual tomate que é fruta...
mas não combina com o meu pomar.

Então resolvo...
Que fique em outra de mim.
Eu, aqui, só fico só.

Raiz pra fora e semente pra dentro...


Dona Doida


Uma vez, quando eu era menina, choveu grosso,
com trovoada e clarões, exatamente como chove agora.
Quando se pôde abrir as janelas,
as poças tremiam com os últimos pingos.
Minha mãe, como quem sabe que vai escrever um poema,
decidiu inspirada: chuchu novinho, angu, molho de ovos
Fui buscar os chuchus e estou voltando agora,
trinta anos depois. Não encontrei minha mãe.
A mulher que me abriu a porta, riu de dona tão velha,
com sombrinha infantil e coxas à mostra.
Meus filhos me repudiaram envergonhados,
meu marido ficou triste até a morte,
eu fiquei doida no encalço.
Só melhoro quando chove.

Adélia Prado

domingo, 26 de outubro de 2008

Entremeados...


Conhecia Adélia Prado de alguns livros e sites de poesia, mas confesso que apenas procurei me inteirar de sua obra, após presenciar vários momentos onde Padre Fábio expressava em palavras e emoção a sua admiração pela autora mineira.

Na última sexta, durante a aula de cinema e literatura, durante a apresentação das sugestões de eventos culturais para o final de semana, um amigo trouxe-nos Adélia. Uma degustação literária com textos dela, aconteceria em um dos centros culturais do Rio... "A Carla gosta, professora!" já apontando outra amiga, como criança que quer constranger o colega...

Sorte que minha memória não estava lá tão mal assim... e mesmo dentro da minha timidez, atendi à solicitação da professora e falei alguns trechos que estavam em mim. A professora, inspirada, começou a lembrar de alguns... e eis que surge o nosso tema literário da semana... vida e obra de Adélia Prado. Incluindo um de seus textos, à nossa escolha, para recitarmos em grande estilo!

Fiquei emocionada e feliz... em ver como a vida é feita de tramas... de fios que, desconhecidos, se entrelaçam e formam um todo familiar que dá algum sentido ao nosso coração...

Ontem foi o dia de Adélia... por coincidência, no Centro Cultural da Justiça Eleitoral, que ocupou o antigo prédio que tanto conheceu meus passos de menina. Subi as escadas voltando no tempo, quando acompanhava minha tia em visitas saudosas ao antigo local de trabalho. Ela e minha avó haviam dedicado grande parte de sua vida àquelas salas... as imponentes pinturas de Antônio Parreiras as viram passar inúmeras vezes com seus cabelos impecáveis e saltos tagarelando alto no imenso pé direito que culmina numa cúpula, por onde entra, teimoso, o mesmo sol de outrora. Tudo revestia-se de um significado novo, maior.

Assim cheguei pra ver Adélia.... foi tão bonito que ela também teria chorado conosco ao ver a interpretação das jovens atrizes. Coloquei-me ao alcance de suas palavras e deixei-me render pela emoção...

Levei as impressões daquele momento durante o passeio pela orla de Copacabana... tanto, que ao passar pelo calçadão onde Carlos Drummond de Andrade sentava-se displicentemente em um dos bancos, quase pude ouvi-lo dizer: "Dê-me notícias... como vai minha menina fenomenal?"...

Mas a noite ainda não terminara e na mesma orla de Drummond, a poesia me alcançou novamente em forma de arte... uma amiga queria nos apresentar a um artista da feirinha do posto 5, Abdiá de Sá... e lá estava Deus e seus pequenos detalhes.

Do lixo, Abdiá faz poesia. Retira do ferro-velho, do entulho, a matéria prima de sua arte. O que é jogado fora, ele recolhe... e com suas mãos de artista e a sensibilidade de um poeta, transforma em arte e beleza...

Ele nos explica, com sua fala cheia de sabedoria, que um de seus "Dom Quixote" era diferente... era o maior de todos... este finalmente iria encontrar a Dulcinéia. Por isso, ao invés de um escudo, trazia na mão uma rosa e um pergaminho... onde ele havia escrito tudo o que sempre quis dizer à sua amada... Retirou o pergaminho de aço da escultura e colocou em nossas mãos: "Pesado, não é? É o peso de todo o amor que ele arrastou pela vida... ele tinha muito a escrever... as palavras pesam."

As palavras pesam. Pesaram as da Adélia. Pesaram as de Abdiá. Mas um peso que não cansa. Um peso que faz ficar em nós.

Voltamos em meu carro comentando a simplicidade e a emoção daqueles momentos. Após todos seguirem seus caminhos, segui o meu pensando... Meu Deus! Afinal, viver também não é isso? A poesia de um chuchu novinho e a arte que temos que fazer com o que foi parar no lixo??? Porque... sinceramente... se não for isso o que temos que fazer com o nosso lixo, então retiro tudo o que disse até hoje e digo que não sei mais o que é viver...

Atravessei a ponte sem lembrar de ligar o CD. só pensava na feira do dia seguinte: "moço... vc tem chuchu bem novinho?".

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

A estrada que há em mim...


Estive em Petrópolis ontem para comprar os ingressos para o show do Padre Fábio de Melo...

Na última vez que estive lá para assistir ao programa Direção Espiritual, já era noite quando subi, e ainda não havia amanhecido quando voltei... não pude ver o que o caminho havia reservado pra mim.

Estava começando a subir a serra e o sol forte manchava o chão com sombras e lembranças...

Como um susto, aquelas árvores que brincavam com a luz levaram-me de volta a um tempo que eu havia esquecido guardado em algum lugar. O brilho que me ofuscava a visão era o mesmo que encantava a menina do banco de trás, que fazia questão de sentar de um jeito que pudesse ver a estrada e o vai-e-vem dos pés e mãos do motorista.

Chegavam as férias e eu aguardando só por aquele momento. O engraçado... é que percebi que tenho poucas lembranças dos dias na casa de Petrópolis... Mas não esqueci o fascínio das sombras do caminho que tantas vezes me viu passar.

Me fiz menina de novo e chorei a saudade daqueles dias, onde tinha não só as sombras... tinha o colo de mãe, pai, avó, tia... onde eu deitava para sentir a luz fugidia e ver as curvas que revelavam outras curvas...

Parei na queijaria... afinal, estava menina e criança não pode dirigir... Alguém perguntou se estava tudo bem... e estava. Existem saudades boas que esquecemos de lembrar. Esta foi uma delas.

O que ficou daqueles dias hoje faz parte de mim. Dirigir ficou como uma paixão. Estrada é quase um lugar sagrado, onde tenho aprendido coisas que os caminhos cotidianos não poderiam dizer. É onde me coloco pequena que sou, e vejo como recebo bem mais do que mereço.

Fiquei feliz pela lembrança recuperada...
pelos ingressos disputados...
pelo que sei que ainda virá...

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Para mim...


Escrevo porque encontro nisso
um prazer que não consigo traduzir.
Não sou pretenciosa. Escrevo para mim,
para que eu sinta a minha alma falando
e cantando, às vezes chorando.

(Clarice Lispector)

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Fechado para balanço...


Estou sentindo muito frio. Parece que o sol desses dias, que tão quentes têm sido, não deixou resquícios nesta madrugada escura. O frio de fora, ainda que intenso, não é maior do que o que vai aqui por dentro do meu peito. Não deveria ser assim. O calor das coisas que me inquietam não tem as cores de um sol que aquece. Queima gelado. É doído e desconcertante saber o gelo deste calor.

Estou com um não sei o quê nas minhas veias. Uma inquietação. Me sinto inadequada a tudo. Como se não coubesse no que tenho que ser. Eu inquieto, desaprumo, descompasso. Será que isso é coisa que se sinta? Já não sei mais se caibo dentro do normal que as coisas têm que ser em mim. Perdoem-me, mas as lágrimas passeiam na nitidez da minha visão e assim escrevo. Algo há de não sair bem.

Eu não sei mais viver como era e não sei se isso é bom. Tudo o que sempre revestiu meus caminhos já não serve mais pra muita coisa. O que veio com a novidade em minha estrada está perdido em seu caminho dissonante. Não sei o que fazer com os sentimentos que procuram abrigo em mim. Também não sei o que fazer com o que é de mim que vai por fora de tudo.

O que comprime o ar em meu peito é sentimento que deixei crescer, erva daninha que é, no espaço que ficou oco entre dois sonhos. Já não sei o que é normal. A normalidade passou por caminhos distintos do meu e, por mais que eu negue, já perdemos nossa intimidade.

Estou pela metade, não consigo me achar completa. Ainda que me desfaça em metades, não saberia achar o outro lado do que era eu. Estranho sentir que não tem lugar. Não tem espaço para ser e, ainda assim, é o que me preenche os dias, é o que me esvazia as noites.

Queria agora não ter que dizer nada. Queria bastar-me na ausência de mim mesma. Derramar-me qual vela transfomada pelo fogo, que se esvai lenta e difusa, e pára um pouco além em sua própria dureza reconquistada.

Queria apenas não ser por um momento. Queria a liberdade de poder dizer que já não sou e nem estou. Para assim, refazer-me, até que chegue o tempo de superar o casulo que me limita e renascer em um dia claro.


Enquanto isso, lá fora, só um aviso...

Não insista: Fechado para balanço.


sábado, 11 de outubro de 2008

Meu coração anda reclamando o que por direito é seu
A paz que eu pensei soubesse existir
E que agora não sabe mais por onde chegar até aqui

Hoje um desassossego ronda o ritmo dos meus passos
E cheia de coisas vazias, parece que vou sublimar

Dá pra voltar pro final da fila???


sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Quisera eu...

Quisera eu...
Ter o dom de saber escrever.
Aí, quem sabe, colocaria por aqui e ali
Um tanto de tudo que não consigo colocar para fora.
Iria tecendo, em verso e prosa,
Minhas lágrimas e seus motivos,
Meus sorrisos e seus desatinos.
Iria dizer, por assim dizer,
O que muitas vezes a boca professa mas não diz.
Porque a boca só diz o que quer,
Não o que a gente sente.
Palavra dita é escrava do ouvido alheio.
É imediata e precisa do outro pra fazer sentido.
Já o que eu escrevo,
Isso lá pode ficar por anos numa gaveta esquecido
E ainda assim, terá saído de mim.
Até passar a vergonha de dizê-lo livre,
Ou a até chegar a coragem que faltou para dizê-lo meu.
Escrever é lindo ofício de não dizer.
É espera e solução.
É remédio e perdição.
Quisera eu saber poder.

Quisera eu...






quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Água na janela

Hoje o dia chegou de mansinho
Me encontrou ainda tentando entender que já não era noite
Chegou com frio, chuva e uma neblina densa
Ele chegou, e eu fui deitar
Ouvi os passarinhos chegando, barulhando...
Procurando a água que eu não colocara
Então o sono ficou pra depois
Mas já era depois afinal
Eu precisava sorrir para os beija-flores
Dormir podia esperar
A água não...