Eu fiquei ali, sem um ruído, tentando digerir minhas incapacidades. Ainda me flagro em pensamentos que não combinam com o que eu quero para mim. E vivo para tentar equilibrar pesos e medidas, pensamentos e palavras, realidades e ilusões. Indigestão anunciada, fazendo-se passar por despercebida ancorando-se em um sorriso de um amarelo senil, esforçando-se por ser arco-íris.
Não sei o que me deu. Mas também não fiz força para saber. Prefiro deixar assim, que se tornem palavras dispersas aqui dentro, que se reconfiguram e se articulam quando fora de mim.
Procurar entender seria uma maneira a mais de fazer doer. Saber porque é uma forma de não saber. Como já disse o poeta, significados definitivos encerram em si conceitos engessados em sua dureza de ser o que é sem que consigam ser o que podem. À miúde, podem muito; à priori, muito pouco serão. Por dentro, movimento que clama liberdade. Por fora, rigidez imposta por definição.
Ainda assim, minha racionalidade adquirida tenta dizer-me o que vai aqui no peito. Incomoda saber que o que me atinge, não é o que recebo do outro, mas o que não encontro quando busco em mim.
E, hoje, foi isso o que aconteceu. O silêncio absurdo que chegou com o inesperado da narrativa a mim imposta, deixou expostas as marcas que não sabia como minhas. Eu as tinha no peito, mas não as admitia como parte de mim. Deixava que ficassem ali quietinhas alimentadas de realidades distorcidas e negativas articuladas em nuances puerís.
Difícil reconhecer-se só diante de suas fraquezas, erros e omissões. Difícil mesmo é o reconhecer-se em si.
O que vejo, sou eu de joelhos diante do que não posso, do que jamais poderei. Tentando sorver em gotas um rio que passa veloz e se faz mar logo adiante. Água que é doce, invadida de sal.
O que sinto, sou eu reconhecendo as cicatrizes que me fiz e as que deixei ferir em mim. Cicatrizes impostas, cicatrizes permitidas, cicatrizes desejadas.
Hoje, a que me dói foi chegando aos poucos. No começo era um calor manso. Depois tornou-se desconforto. Agora é a dor da carne desagregada de sua condição de una que, ferida, sangra o vermelho de suas dores.
Queria naquele momento apenas o direito de nada dizer. Queria o direito de silenciar sem que isso incomodasse ou sucitasse divagações alheias inúteis. Queria o direito de não sorrir uma falsa alegria. E ainda assim, me fazer entender.
Eu pequei. Não compartilhei da alegria dividida. Fui infiel aos meus valores. Fui desconexa com meu caráter. Sorri sem sorrir. Agradeci sem gratidão. Orei sem oração. Invejei o que não pode ser invejado, simplesmente por ser o que o outro gostaria que fosse, e não o a realidade do que de fato existe.
Confessar-me pecadora é virtude pretenciosa? Se for, assumo que não saberia ser de outra forma senão assim. Se for, assumo que peco novamente pela pretensão de achar em mim virtude que valha.
Eu pequei. E o pior é que o pecado continua em mim. Ardendo em minhas ausências, antes inundadas de ilusões. O descortinado da realidade mostrando-me que nada é, diante do que queria que fosse.
E isso veio através do detalhe de simples palavra no meio daquilo tudo que meus ouvidos sorviam - "Também". Veio inundada de um orgulho besta que antes era meu e eu não sabia. "Também". Veio arrebatar-me do pensamento que me julgava estar em lugar diferente, mais acercado do que os longes laivos em que me encontrava ancorada.
Importante eu parar.
Para deixar o que dói desembarcar.
Depois... Importante não parar.
(Não entendeu? Que bom. Pensei que tinha sido só eu.)
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